
Nesta edição da nossa coluna, damos voz a uma história real e profundamente tocante.
Com uma escrita sincera e corajosa, Priscila uma mulher multifacetada, esposa, professora, filha dedicada e acima de tudo, mãe. Ela nos convida a conhecer sua vivência com o autismo dento da própria família. Seu relato é marcado por sensibilidade e força. Ao compartilhar sua experiência como mãe de duas meninas, sendo uma delas atípica, Priscila revela não apenas os desafios do dia a dia, mas também a fé e a esperança que sustentam sua caminhada. Este testemunho é um convite a empatia e a reflexão sobre a maternidade que foge dos padrões idealizados, sobre a solidão que tantas mães enfrentam e sobre o poder de se reconstruir mesmo em meio ao caos. Mais do que um desabafo, suas palavras revelam uma jornada de resiliência, fé e amor incondicional. Em um mês em que tanto se fala sobre a conscientização do autismo, este relato certamente tocará o coração de muitos leitores e nos lembrará da importância de valorizar as múltiplas formas de maternar.
Meu nome é Priscila.
Sou esposa, professora, filha de um casal que sempre priorizou a educação e mãe apaixonada da Alice, de 10 anos, e da Mariana, de 8.
O autismo entrou na minha vida como um tornado, há 8 anos. Depois daquela tempestade física e emocional, percebi que muita coisa havia sido destruída, mas a estrutura continuava firme. Ou quase!
Naquele momento tive que fazer uma escolha: me reconstruía colando meus cacos ou sucumbia de vez nos escombros da minha alma.
Apesar de atrativa a segunda opção era logicamente improvável.
Na época da investigação do diagnóstico Alice tinha 2 aninhos e Mariana, apenas 4 meses. Dois bebês!
Foi aí que percebi que naquele momento não daria para sonhar com balé, aula de piano e vida social ativa.
Médicos e terapeutas passariam a ser a nossa realidade a partir de então.
E eu, a mãe, mergulhei de cabeça!
Não consigo precisar quanto tempo levou para eu me reerguer. E para falar a verdade doída, nunca mais fui a mesma.
Minha versão materna atípica ganhou nuances de revolta — confesso —, mas também muita ousadia e um tiquinho de atrevimento.
Descobri que o terreno da atipicidade é solitário. E infelizmente, muito feminino.
Descobri que não havia lugar de fala reservado para as mães que não conseguem avanços robustos com os filhos.
E nós existimos!
A maioria dos nossos filhos não será campeã das Olimpíadas de Matemática — assim como a maioria das crianças típicas também não será!
O que nos difere é a preocupação com a inclusão de um indivíduo que exige tanto suporte numa sociedade altamente capitalista e excludente.
E nesse caso, o indivíduo é nosso filho. Nosso tesouro.
Tudo vira pessoal.
Comentários se tornam invasivos, conselhos se tornam inoportunos e a rede de apoio se esvazia rapidamente.
O motivo é simples: nossos marcos temporais não acompanham os marcos das crianças típicas.
Comumente teremos adolescentes que ainda necessitarão de suporte como se fossem crianças.
E tudo aquilo que não funciona precisa ser substituído — e o século XXI ainda não tem uma forma eficaz de “consertar” nossas crianças.
Lógico que eu gostaria de estar no lugar da mãe cujo filho superou todas as dificuldades e tem uma linda história de superação.
Mas Deus separou para mim o lado de aguardar o suprimento das necessidades diárias e confiar nas bênçãos do porvir.
O meu testemunho é pautado na esperança.
Não me guio pelo que vejo, nem pelo que sinto.
Me guio pela fé no impossível, além do que os olhos veem…
Por Priscila Pereira